"O teatro é isso: a arte de nos vermos a nós mesmos, a arte de nos vermos vendo!"
(Augusto Boal)

quinta-feira, 21 de janeiro de 2010

"Não quero a gravação: eu quero o grito."

Em um post anterior, lembrando Fernando Pessoa, havia comentado minha certa... predileção "habitual" pelo que não é dos príncipes. No "Poema em Linha Reta" Pessoa reclama deste mundo cheio de "semideuses", que não confessam as infâmias, as vilezas, as covardias, e até a vontade de não tomar banho...

E como isso tem a ver com ser terapeuta! Afinal, nós abrimos espaço para essa "angústia das pequenas coisas ridículas", nós não estamos preocupados com os ideais, com a perfeição, com a aparência, com o que está pronto. Nos interessa, isso sim, descobrir "onde há gente no mundo"! Deixamos os semideuses fora da clínica...

É verdade que estou falando de uma forma específica de terapia, e não de todas: muitos terapeutas buscam mesmo é criar príncipes e semideuses, felizes, perfeitos, desenvolvidos, calmos, equilibrados, "saudáveis", comportados, funcionais, adequados...

Eu fiquei me perguntando - e resolvi compartilhar a dúvida, afinal, como diz o Jean-Marie Robine, esse negócio de se perguntar é uma retroflexão daquelas bem pequenininhas - se a canção do Lenine, abaixo, não tem a ver com isso.
Ela tem a ver com você?




O que é bonito
É o que persegue o infinito
Mas eu não sou
Eu não sou, não...
Eu gosto é do inacabado
O imperfeito, o estragado que dançou
O que dançou...
Eu quero mais erosão
Menos granito
Namorar o zero e o não
Escrever tudo o que desprezo
E desprezar tudo o que acredito
Eu não quero a gravação, não
Eu quero o grito
Que a gente vai, a gente vai
E fica a obra
Mas eu persigo o que falta
Não o que sobra
Eu quero tudo
Que dá e passa
Quero tudo que se despe
Se despede e despedaça

O que é bonito...

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