Caríssimos,
Esta semana estreia no TAC, em Florianópolis, o espetáculo teatral Branco, dirigido por Leandro Lunelli, com uma proposta ousada e sensível. Atendendo um convite, Leandro escreveu especialmente para o Gestalt em Cena, contando um pouco sobre o processo criativo, e nos deixando com mais curiosidade sobre o que veremos em Branco.
Boa leitura, e bom espetáculo!
’Em branco’
‘Branco’ é
um projeto teatral que me ocupou mais de um ano e meio, e que agora, nos fins
de maio, pretende finalmente subir ao palco. Descrevo brevemente nessas linhas
o nosso processo de concepção da dramaturgia e seu entrelaçamento nas criações
plásticas da linguagem cênica trabalhada.
Farei o
esforço em separar aqui as linhas dramatúrgicas do espetáculo descrevendo-as
individualmente, mas penso que talvez seja um pouco difícil visto que todo o
processo foi construído simultaneamente e de maneira integrada, sem constituir
etapas fragmentadas no processo criativo. Ou seja, ‘tudo junto e misturado’.
‘Branco’,
rapidamente, é um espetáculo teatral que se utiliza da articulação de vários
meios artísticos, como as artes plásticas, a música, a dança e o cinema, junto
às artes cênicas na tentativa de transformar a experiência teatral do
espectador. Tenta fazê-lo vivenciar o espetáculo muito mais do que somente
assisti-lo. Queremos levá-lo o mais próximo possível da narrativa apresentada
no palco. Não temos aqui, como alguns podem pensar, um espectador ativo ou
participativo do evento teatral – como o engajado por Bertold Brecht, por
exemplo – mas um público ‘integrante’ do espetáculo.
Quando
me refiro a um público ‘integrante’, não podemos fazer com que o pensamento nos
conduza a um espectador que faça parte da dramaturgia da cena, mas um signo que
se faz ao mesmo tempo observador da cena e sensorialmente integrante dela. Digo
isso, pois o ‘Branco’ tem, em suas concepções, o objetivo de misturar arte e
tecnologia. Assim, juntando essas duas possibilidades de trabalho – um público
‘integrante’ e os efeitos especiais, resultado da perpendicularidade entre a
arte e as tecnologias – obtemos um espetáculo em 6D.
Seis
dimensões: três relativas ao comprimento, altura e largura da própria arte
cênica e das projeções em 3D; e mais três dimensões sensórias: tato, olfato e
paladar - alcançadas através dos efeitos especiais. Ou seja, pesquisa-se aqui e
assim, um diferente modelo de interpretação pautado na interação do ator com os
meios tecnológicos. Entendendo: um ator que cheira uma flor no palco italiano
se expressa com esta ação. O espectador não somente o vê cheirando uma flor e
se ‘toca’ na reflexão da ação imagética do ator, mas se posiciona junto a ele
na ação, principalmente, quando ao assisti-lo, também sente o cheiro da flor.
Assim, o ator ganha expressões antes inalcançáveis e o público integra o
espetáculo ao ser inserido sensorialmente na narrativa.
Para isso,
a dramaturgia original foi construída e submetida a todas essas intenções
conceptivas do projeto. O que transborda estas intenções é a linha dramática
embrionária do espetáculo: um pequeno texto que delineia poucas informações
sobre os personagens, o espaço e a história que antecede e dá o ponto de
partida da narrativa. Assim, para escrever este pequeno ‘roteiro’, foram
definidas duas principais questões: o enfoque ‘humano’ que queríamos trabalhar
– a amizade como forma de vida – e o espaço pela qual a narrativa se
apresentaria – o surreal dos sonhos, o mundo onírico. Pontos indispensáveis e
condutores de todo o trabalho.
Para
começar a escrever esta linha dramática, lembro-me que a Karine Cupertino,
auxiliar de dramaturgia, em uma das muitas conversas que tivemos, solicitou que
eu pedisse aos membros da equipe que, todos os dias, após acordarem, anotassem
seus sonhos e os enviassem por e-mail. Um dos apontamentos que ela me fez nesta
mesma reunião foi que eu passasse muita confiança ao fazer este pedido, para
que a recém-formada equipe não temesse detalhes ao descrever seus sonhos: “Eu
sei que existem coisas extremamente pessoais nos sonhos, e que às vezes temos
vergonha de compartilhá-los: são ‘monstros’. Mas tente transmitir confiança, pois
são justamente esses ‘ouros’ que precisamos captar e trabalhar em cima da
dramaturgia. É isso que necessitamos desconstruir e trazer para a nossa
história, pois dará força e veracidade”.
E ela tinha
toda razão!
Queríamos
um projeto mergulhado no surrealismo dos sonhos, nos imprevistos do evento
onírico, na realidade transfigurada. Queríamos transmitir aquele ‘monstro’.
Sensibilizar através do impossível, da fantasia deste mundo onde tudo é
verdadeiro. Onde a essência tem rosto e a crueldade é bela. Onde nós realmente,
e possivelmente, somos nós mesmos.
Depois de
muito se transformar, com a entrada e saída de pessoas da equipe, modificando e
pesquisando os mínimos detalhes da dramaturgia final, hoje olho para o projeto,
para o espetáculo, e percebo que a equipe se sente integrante da história e que
esta própria história tem uma força indiscutível. Frequentemente eu ouvia nos
ensaios gerais a iluminadora pensando alto: “Nossa, esta ação se parece em
muito com aquilo que eu sonhei”. Suspeito que eles esqueceram o que sonharam
naquela época, e o que talvez a Karine captou e transformou para o espetáculo,
mas sinto que ele é filho de muitos.
2 comentários:
Adorei! Estarei lá, com certeza...
BRANCO - 6D
25/quinta - 19h
26/sexta - 19h e 21h
27/sábado - 20h
no TAC
INGRESSOS GRATUITOS!
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